sexta-feira, 16 de maio de 2008

OAB e FORO ESTADUAL...Autarquia especial????

AÇÃO ORDINÁRIA (PROCEDIMENTO COMUM ORDINÁRIO) Nº 2008.70.03.001731-3/PR
AUTOR
:
CAMILO FRANCO DA ROCHA
ADVOGADO
:
REINALDO RODRIGUES DE GODOY
RÉU
:
CONSELHO FEDERAL DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL
:
COMISSÃO DE ESTÁGIO E EXAME DE ORDEM - DA SECCIONAL DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO PARANÁ
:
UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO

Vistos em inspeção.
Trata-se de ação ordinária proposta por CAMILO FRANCO DA ROCHA objetivando a declaração de inconstitucionalidade da exigência de aprovação no exame da OAB como condição para o exercício da advocacia ou, alternativamente, a majoração da nota atribuída pela banca examinadora à sua prova.
Requer a antecipação dos efeitos da tutela, os benefícios da Justiça Gratuita e junta documentos.
DECIDO.
Primeiramente, declaro a ilegitimidade da União para figurar no pólo passivo da demanda, tendo em vista a sua completa ausência de interesse no resultado da lide e a impossibilidade de sua responsabilização patrimonial pelos atos praticados pela OAB. O pedido de declaração de inconstitucionalidade, por si só, não reclama a inclusão do ente federativo na relação processual.
Afora isso, o pedido de "citação" da União (fl. 55, item 01, "a") não foi sequer justificado.
Os feitos envolvendo a OAB vinham sendo normalmente processados e julgados pela Justiça Federal de primeiro grau, porque era entendimento comum que a Ordem tinha natureza jurídica de autarquia federal, ainda que de regime especial, sendo seus dirigentes equiparados a autoridades federais, ajustando-se à previsão do artigo 109, inciso VIII, da Constituição da República.
Nesse sentido, era a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:
PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO DE COMPETENCIA. OAB. MANDADO DE SEGURANÇA.
1. A ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL E AUTARQUIA PROFISSIONAL ESPECIAL, COM PERFIL DE SERVIÇO PUBLICO FEDERAL DE NATUREZA INDIRETA.
2. A COMPETENCIA PARA PROCESSAR E JULGAR AÇÕES DO INTERESSE ATIVO OU PASSIVO E DA JUSTIÇA FEDERAL.
3. OS EFEITOS DA MEDIDA PROVISORIA NUM. 1549-39, DE 06.11.97, NÃO ATINGEM A ESTRUTURA ORIGINARIA DA OAB.
4. A MEDIDA PROVISORIA NUM. 1.654/98, EM SEU ART. 8., DETERMINOU SER A JUSTIÇA FEDERAL COMPETENTE PARA PROCESSAR E JULGAR AS CAUSAS DO INTERESSE DAS ENTIDADES DE FISCALIZAÇÃO DO EXERCICIO PROFISSIONAL.
5. CONFLITO CONHECIDO PARA DETERMINAR A COMPETENCIA DA JUSTIÇA FEDERAL.
(STJ, 1ª Seção, CC 21255 / ES, Rel. Min. José Delgado, j. 24/4/1998)
Ocorre que, recentemente, houve importante modificação no entendimento jurisprudencial quanto à matéria, com o julgamento da ADIN 3026-DF, no Supremo Tribunal Federal, relator Min. Eros Grau.
A ADIN, proposta pelo Sr. Procurador-Geral da República, visando à exigência de concurso público para o provimento de cargos de servidores da OAB (art. 79 da Lei. n. 8.906/1994), foi julgada improcedente (sessão de 08/06/2006, publicada no DJ de 29/09/2006), vencidos apenas os Ministros Gilmar Mendes e Joaquim Barbosa, firmando-se o entendimento que a OAB não é pessoa jurídica de direito público, autarquia (nem mesmo de regime especial), não tendo qualquer vinculação com a administração pública indireta, garantindo-se, assim, sua independência na consecução de suas missões históricas e constitucionais (e por isso não se submetendo à regra do concurso público).
Colaciono a ementa do referido julgado:
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. § 1º DO ARTIGO 79 DA LEI N. 8.906, 2ª PARTE. "SERVIDORES" DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL. PRECEITO QUE POSSIBILITA A OPÇÃO PELO REGIME CELESTISTA. COMPENSAÇÃO PELA ESCOLHA DO REGIME JURÍDICO NO MOMENTO DA APOSENTADORIA. INDENIZAÇÃO. IMPOSIÇÃO DOS DITAMES INERENTES À ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DIRETA E INDIRETA. CONCURSO PÚBLICO (ART. 37, II DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL). INEXIGÊNCIA DE CONCURSO PÚBLICO PARA A ADMISSÃO DOS CONTRATADOS PELA OAB. AUTARQUIAS ESPECIAIS E AGÊNCIAS. CARÁTER JURÍDICO DA OAB. ENTIDADE PRESTADORA DE SERVIÇO PÚBLICO INDEPENDENTE. CATEGORIA ÍMPAR NO ELENCO DAS PERSONALIDADES JURÍDICAS EXISTENTES NO DIREITO BRASILEIRO. AUTONOMIA E INDEPENDÊNCIA DA ENTIDADE. PRINCÍPIO DA MORALIDADE. VIOLAÇÃO DO ARTIGO 37, CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. NÃO OCORRÊNCIA.
1. A Lei n. 8.906, artigo 79, § 1º, possibilitou aos "servidores" da OAB, cujo regime outrora era estatutário, a opção pelo regime celetista. Compensação pela escolha: indenização a ser paga à época da aposentadoria.
2. Não procede a alegação de que a OAB sujeita-se aos ditames impostos à Administração Pública Direta e Indireta.
3. A OAB não é uma entidade da Administração Indireta da União. A Ordem é um serviço público independente, categoria ímpar no elenco das personalidades jurídicas existentes no direito brasileiro.
4. A OAB não está incluída na categoria na qual se inserem essas que se tem referido como "autarquias especiais" para pretender-se afirmar equivocada independência das hoje chamadas "agências".
5. Por não consubstanciar uma entidade da Administração Indireta, a OAB não está sujeita a controle da Administração, nem a qualquer das suas partes está vinculada. Essa não-vinculação é formal e materialmente necessária.
6. A OAB ocupa-se de atividades atinentes aos advogados, que exercem função constitucionalmente privilegiada, na medida em que são indispensáveis à administração da Justiça [artigo 133 da CB/88]. É entidade cuja finalidade é afeita a atribuições, interesses e seleção de advogados. Não há ordem de relação ou dependência entre a OAB e qualquer órgão público.
7. A Ordem dos Advogados do Brasil, cujas características são autonomia e independência, não pode ser tida como congênere dos demais órgãos de fiscalização profissional. A OAB não está voltada exclusivamente a finalidades corporativas. Possui finalidade institucional.
8. Embora decorra de determinação legal, o regime estatutário imposto aos empregados da OAB não é compatível com a entidade, que é autônoma e independente.
9. Improcede o pedido do requerente no sentido de que se dê interpretação conforme o artigo 37, inciso II, da Constituição do Brasil ao caput do artigo 79 da Lei n. 8.906, que determina a aplicação do regime trabalhista aos servidores da OAB.
10. Incabível a exigência de concurso público para admissão dos contratados sob o regime trabalhista pela OAB.
11. Princípio da moralidade. Ética da legalidade e moralidade. Confinamento do princípio da moralidade ao âmbito da ética da legalidade, que não pode ser ultrapassada, sob pena de dissolução do próprio sistema. Desvio de poder ou de finalidade.
12. Julgo improcedente o pedido.
(STF, Tribunal Pleno, ADIN 3026-DF, Rel. Min. Eros Grau, j. 08/06/2006, DJ 29/09/2006, p. 31, EMENT VOL-02249-03 pp-00478)
Ora, em assim sendo, não se justifica mais manter a OAB com foro na Justiça Federal, pois, não sendo entidade autárquica federal, com bem afirmou o STF, não se enquadra na competência cível ratione personae da Justiça Federal, preconizada no artigo 109, inciso I, da Constituição.
Da mesma forma, v.g., os dirigentes da OAB não podem ser considerados autoridades federais para fins de mandado de segurança, pois não recebem qualquer delegação ou derivação de poder de qualquer entidade federal e as conseqüências de ordem patrimonial do ato da OAB não serão suportados pela União ou pelas entidades autárquicas federais, conforme já ressaltado.
Embora a manifestação do Supremo Tribunal Federal venha agora a lançar uma pá de cal sobre o assunto, é verdade que o Superior Tribunal de Justiça já vinha sinalizando nesse sentido, conforme se vê pelos seguintes julgados:
CONFLITO DE COMPETÊNCIA - AÇÃO CIVIL PÚBLICA PROPOSTA PELA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, SECCIONAL DO TOCANTINS, E PELO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL - CONCURSO PÚBLICO PARA O CARGO DE JUIZ SUBSTITUTO - COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ESTADUAL.
1. Inexiste entre a Ordem dos Advogados do Brasil e a Administração Pública Federal Direta vínculo de coordenação ou subordinação hierárquica e funcional.
2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem afastado a competência da Justiça Federal, quando não houver interesse direto e manifesto da União.
3. Em Ação Civil Pública, a regra para a fixação da competência é territorial e funcional, definindo-se pelo local onde ocorreu o dano e, sobretudo, pela função exercida pela autoridade pública, a quem se atribui a responsabilidade do dano ocorrido (Lei nº 7.347/85, art. 2º).
4. Ação Civil Pública proposta contra concurso público, para o provimento de cargo de Juiz Substituto do Estado do Tocantins, deve ser processada e julgada na Justiça Estadual, devido à obrigação do Poder Judiciário de zelar pela intangibilidade do Pacto Federativo e pela garantia da autonomia dos entes federados.
5. Conflito conhecido, para declarar a competência da Justiça Estadual.
(STJ, 3ª Seção, CC 47613-TO, Rel. Min. José Arnaldo da Fonseca, Rel. p/ acórdão Min. Paulo Medina, j. 22/6/2005, DJU 22/8/2005)
PROCESSUAL CIVIL - RECURSO ESPECIAL - MANDADO DE SEGURANÇA - ATO DE PRESIDENTE DE SUBSEÇÃO DA OAB - COMPETÊNCIA - PROCESSO DISCIPLINAR - QUEBRA DE SIGILO - IMPOSSIBILIDADE.
1. A Justiça estadual é competente para processar e julgar mandado de segurança contra ato de Presidente de Subseção da OAB restrito à esfera de sua competência, que não se projeta no âmbito federal.
2. Inadmissível a divulgação ostensiva dos nomes dos indiciados em processo disciplinar, quando inexiste decisão definitiva do órgão competente sobre presumível infração à ética profissional pelos implicados.
3. Recurso conhecido, porém, improvido.
(STJ, 2ª Turma, REsp 235723, Rel. Min. Francisco Peçanha Martins, j. 19/2/2002, DJU 04/11/2002, RSTJ 161/190).
Assim, EXCLUO de ofício a UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO do pólo passivo e, termos dos artigos 103 e seguintes do CPC, DECLINO DA COMPETÊNCIA PARA PROCESSAR E JULGAR ESTA AÇÃO EM FAVOR DA JUSTIÇA ESTADUAL DO PARANÁ.
Quanto ao pedido de Justiça Gratuita, nada obstante não tenha sido juntada aos autos declaração de hipossuficiência econômica, considerando o baixo valor atribuído à causa (R$ 100,00), que reclamaria o recolhimento das custas no valor mínimo (apenas R$ 10,64), e a fim de dar maior agilidade ao procedimento, dispenso a parte autora do pagamento das custas processuais na Justiça Federal.
Intime-se.
Decorrido o prazo recursal, encaminhem-se os autos à SRIP para exclusão da UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO do pólo passivo e, em seguida, remetam-se os autos à Justiça Estadual desta Comarca para a competente distribuição, com as baixas e anotações de praxe.
Maringá, 15 de maio de 2008.

José Carlos Fabri
Juiz Federal Substituto na Titularidade Plena


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